O sapo da macumbeira
Foi quando a macumbeira que morava na
esquina descendo a rua João da cruz, chamou os Cavaleiros que brincavam de
mamãe da rua, e nos mostrou uma nota de 10 reais. Levantou à frente de seus
olhos, e abaixou rapidamente. Era uma sexta-feira 13, dia em que todos ficam
esperando acontecer coisas ao estilo de dia das bruxas, a mulher fez uma cara
sinistra e sorriu ao dizer:
- Vocês gostariam de ganhar essa nota?
Ver uma nota daquelas não era
comum ainda, pois o real acabava de ser lançado no plano do FHC, e
nós estávamos acostumados a ganhar ou achar somente moedinhas de 5 e 10
centavos, ou no máximo 50 centavos. Ao ver aquela vermelhinha, ficamos doidos;
um olhou para cara do outro e o Ricardo disse:
- É pra já!
Carlitos já começou com aquela euforia
costumeira, mexendo as mãos, falando rápido várias coisas, já fazendo planos do
que faríamos com o dinheiro, e o Ricardo perguntou:
- Mas o que temos que fazer?
- Muito simples! Eu preciso de um sapo, o maior que conseguirem, é
para um trabalho, e eu não consegui encontrar em lugar nenhum.
- É agora!
E saímos naquela correria, afinal não seria difícil encontrar um
sapo, não para os Cavaleiros do Apocalipse.
- Isso é uma missão de Rambo, turma. Temos que nos preparar bem,
disse o Aragon.
Fomos até o clubinho e pegamos os
adereços para ficarmos realmente parecidos com os aventureiros dos filmes.
Faixa na cabeça como o Rambo e guache no rosto como ele fez num daqueles filmes
para se camuflar na floresta; quichute no pé para não pisar em cobras venenosas
que pudéssemos encontrar no meio da floresta (pura imaginação, pois imaginávamos
sempre o pior, nunca vimos nenhuma cobra venenosa no morrão, só cobras de
vidro, mas talvez tivesse alguma, né, era mais divertido pensar assim).
A busca começou divertida, primeiro
procuramos os objetos de trabalho, galhos de árvores eram nossas armas. Paramos
para comer as uvas japonesas que tinham perto do Tenente, e depois começamos a
revirar os lixos perto do rio, abrindo todos os matinhos próximos. Encontramos
vários bichinhos nojentos, mas o sapão que é bom, nada! Fomos até o morrão,
mechemos no mato e o que mais se encontrava eram tatus bolinhas, lesmas e
grilos. Então subimos até o alto, virando o morro e indo pro Embu, e nada dos
sapos (parecia que todos tinham sumido de repente). Andamos o bairro inteiro,
enfiando nossas armas em todos os buracos visíveis e perguntando para as
senhoras se não tinham um sapinho em seus quintais. E nada, a missão tinha se
tornado impossível!
- Que droga, a gente vai ficar sem a vermelhinha!!
- Eu precisava tanto de uma graninha!
- Já era meu carrinho novo!
-
Eu tinha visto um brinquedo da hora na lojinha da Jaci, agora já era também!
- Meu pião novo!
Todos já choramingavam as coisas que não poderiam comprar com a
grana fácil!
- Mas que droga, esses sapos não deveriam ter sumido logo agora
que seriam usados!
- A macumbeira ia fazer trabalho ruim, né?! - Disse já de olhos
arregalados o Lê.
- Ela vai colocar o nome de alguém escrito no papel, e
depois costurar a boca do sapo, para a pessoa morrer, foi o que minha mãe disse
que as macumbeiras fazem!
- Acho que foi bom a gente não ter achado o sapo, vai que era
alguém que a gente conhece, e o cara ia
morrer seco! - Disse o Rodolfo.
Todos arregalaram os olhos e foi cada um pra sua casa.
À noite, depois que fui dormir, exausto pela grande busca do dia, ouvi o coaxar
de um sapo. Levantei-me correndo e fui pra trás da casa. Vi um sapo
enorme, e comecei a pular atrás do infeliz, e ele dava cada salto fugindo das
minhas mãos! Fiquei com medo dele jogar o leite venenoso e me cegar, mas mesmo
assim não conseguia deixar de tentar agarrá-lo. Já tinha virado obsessão
prender um sapo, e de repente ouvi minha mãe me gritando!
- Cassianoooooo!
- Espera mãe, agora eu cato esse danado!
Senti minha mãe me agarrando pela gola, daí, eu comecei a me
debater e berrar.
- Me larga mãe, me larga (balançando os braços e tentando me
soltar)!
- Pára menino, pára com isso já!
- O sapo, eu preciso do sapo, ele vai fugir!
- Acorda, moleque! Você está sonhando!
- Quê?
Um sonho, exatamente isso, leitor, um
sonho. Quando abri os olhos estava até suado de tanto me debater na cama, eu
tinha acordado todo mundo, e diz o Clorisvaldo que eu gritava dormindo:
- Eu vou te pegar, seu sapo safado!! Vem cá, danado!
Enfim,
ninguém conseguiu achar o sapo. Apesar de sempre cruzar com um dos grandes,
naquela semana, e nas seguintes também, todos tinham sumido como um passe de
mágica. Das duas uma: ou a macumbeira estava fazendo muitos trabalhos, ou os
sapos pressentiram a morte e fugiram antes!